segunda-feira, 11 de maio de 2015

Entrevista - Glauber Lopes

Glauber Lopes é ilustrador paulistano. Tem trinta e um anos e desenha dese os seis. Influenciado por obras diversas como Turma da Mônica e Dragon Ball Z, decidiu bem cedo que iria trabalhar com quadrinhos.
Cursou design gráfico  pois era o mais próximo que existia de histórias em quadrinhos. Com muito suor, esforço, estratégia, criatividade e autenticidade, Glauber está atualmente com o projeto Registros que acabou de bater a meta! Uhuul!!
 O Literatura do Guimarães o convocou para que pudéssemos bater um papo saudável sobre quadrinhos...e rendeu BASTANTE! Acompanhem!



LDG – Você disse que foi bastante influenciado por quadrinhos, a ponto de ter decidido a carreira quando criança e escolhido a faculdade baseado nisso. Na sua fase adulta, como trabalhou essa vontade louca de fazer quadrinhos com a necessidade de trabalhar?

Glauber - Já na fase adulta, fiz faculdade de design gráfico pois era o que mais se aproximava do que eu queria naqueles tempos.

LDG – Onde se formou?

Glauber – Me formei nas faculdades Oswaldo Cruz – FAITER.
Nesse meio periodo entre faculdade, formação e o que eu deveria fazer com a minha vida, muito do que eu gostava ficou pra trás porque naqueles tempos não tinha previsão se seria possível viver de ilustrações, muito menos quadrinhos...Então tentei trabalhar em alguns estúdios com design, mas eu nunca encontrei alegria nesses lugares.
 Foi então que comecei a refletir o que eu poderia fazer. Enquanto isso, estava buscando maneiras de manter os quadrinhos vivos. Percebi uma onda crescente de webcomics surgindo na internet então testeria com algum título.
Foi aí que nasceu minha HQ Speed, que conta com 80 episódios hoje em dia, mas desenhados apenas 2 (eu não conseguia encontrar tempo pra desenhar sempre porque chegava muito quebrado do trabalho).
O primeiro episódio tinha levado um ano pra fazer (2008), e o segundo levei mais um ano (2009). E o segundo episódio só saiu por que fui em uma feira de cultura japonesa na época e vendi todas as cópias do primeiro exemplar. Daí queria imprimir uma segunda leva com o segundo, terceiro e quarto episódio, mas eu não estava conseguindo fazer. Vivia trocando de emprego e nenhum me agradava. Tinha perdido o gosto de desenhar por prazer, já que tudo que eu tinha que fazer era por dinheiro. Me incomodava também o fato de todos falarem que mangá não funcionava no Brasil...e eu queria provar que as coisas eram diferentes. Que quadrinho em estilo mangá  poderia ser algo bacana, desde que muito bem feito.

Página de Speed!

 Glauber - Mais uma vez, eu não encontrava tempo pra produzir as coisas do jeito que queria e estava muito desmotivado. Conforme estudava o nosso mercado, descobri que histórias seriadas não vingavam devido a seu alto custo de produção. Nessa época eu lembro que não queria mais saber de produzir até descobrir o que eu poderia fazer com aquilo tudo. Depois de 2009, cheguei a conclusão apenas no final de 2011 que o que eu deveria fazer eram histórias curtas. Dessa forma, poderia seguir trabalhando e concluir algo.
 No comecinho de 2012 escrevi então uma história chamada "Mãe", com começo, meio e fim. Me dei conta de que tinha sido a primeira vez que tinha feito isso, por que tudo que sempre desenhei eram histórias de muitos capítulos (seguindo o raciocínio japonês de histórias seriadas...eu adoro isso).
 Comecei a colocar ela no papel, e apenas pelo storyboard percebi que ela teria mais de 300 páginas.  Pensei comigo que conseguiria desenhá-la dentro de um ano ou dois. Precisaria apenas seguir ganhando dinheiro como freelancer e dando aulas. Mas na época os trabalhos não apareceram mensalmente, me forçando a procurar empresas pra trabalhar como assalariado novamente. Mais uma vez, eu estava sempre cansado e não conseguia produzir nada...
 Foi então que deixei mais uma vez uma estória de lado e achei que era hora de fazer ,então, uma história ainda mais curta. Foi onde nasceu Registros, em que a primeira história eu publiquei inteira no Facebook e tinha apenas 12 páginas. Senti uma alegria muito grande porque enfim tinha conseguido terminar algo! E as pessoas me dando feedback de que gostavam foi ainda melhor!
 Essa motivação toda me fez perceber que eu não estava pronto para grandes histórias...que eu precisava me disciplinar a fazer coisas curtas, pra depois ir aumentando...e assim eu segui desenhando o segundo episódio de registros quando tinha dinheiro comigo. Os freelas foram aumentando, e eu tinha mais tempo pra desenhar a HQ. Apesar disso, só consegui terminar de desenhar HQ no ano de 2014, em meados do final de setembro.
 Foram dois anos de produção e nesse tempo estava procurando maneiras de aprender a desenhar mais rápido. Acabei aprendendo várias técnicas de pintura que me tornaram mais rápido. Acredito que foi por isso que consegui terminar esse projeto. Feito isso, ainda nesse meio tempo, fiz páginas da HQ A Última Fábula de Francisco Costa.
 Percebi como estava desenhando rápido e minha produção tinha melhorado por conta da quantidade de coisas que era capaz de entregar por mês. Feito tudo isso, era hora de investir na campanha pro Catarse, onde levei mais dois meses de produção. Hoje a luta segue pra tornar esse projeto real enquanto participo de outros, como o livro Ciclanos e Ciclanas, de Pedro Balboni.

Ciclanos e Ciclanas


 Glauber - Minha ideia é atingir a meta final dessa campanha, e quando entregar todas as recompensas e trabalhar na venda de Registros, separar o ano que vem para começar meu novo título, que está semi escrito, mas precisa de mais aprofundamento. Aí essa história será em estilo mangá adulto.

LDG - Entendo, cara. Você até que tem uma puta história de vida, relacionada a persistência. (risos)

Glauber - Meu lema é perseverança sempre (risos). Teimosia também (risos).

LDG -  Essas suas duas primeiras histórias, Speed e Mãe. Eram sobre o que?

Glauber - Speed era mangá adolescente, sobre um garoto que queria se tornar campeão de campeonato de bikes no mundo. Ele queria ser o maior e melhor de todos. A história começa em São Paulo, um time de bike bem pequeno que vai crescendo no decorrer do tempo. Mas quando leio, hoje em dia, vejo vários problemas no roteiro e que tenho que mexer em muita coisa.



 LDG – E Mãe?

 Glauber - Mãe já é uma história mais adulta e cruel onde uma menina de doze anos sofre na vida por ter uma mãe inconsequente e irresponsável. Essa mãe acaba se suicidando, se jogando na linha do trem, e a menina fica sozinha no mundo com seus dois irmãos menores. Essa história fala de como as pessoas podem ser egoístas de várias formas.

 LDG - São duas histórias com premissas e tons bem diferentes uma da outra. Isso tem a ver com a sua situação na época em que fez cada uma ou é porquê as ideias vieram de lugares diferentes?

 Glauber - As ideias vieram de lugares diferentes da minha mente, mas todas tem relação comigo. A primeira fala muito da perseverança, que você já percebeu que faz parte de mim. (risos). A segunda fala sobre o ego,e  o meu incluso. Em outras palavras – São fragmentos de mim.

 LDG - Mas como encara as duas histórias? São pessoais a ponto de deixá-lo exposto caso algum conhecido as leiam ou são pessoais estritamente pra você, baseado nas coisas que você pensa e sente sobre os temas sendo abordados?

 Glauber – Segunda opção (risos). A única história que eu me exponho diretamente é Registros...que não tem como ser diferente. Mas na real, eu não gosto de falar de mim...eu prefiro falar de outro jeito. Como a maioria dos quadrinistas fazem.

Desenhos de "Mãe".

 LDG – E onde essas duas primeiras histórias podem ser achadas?

 Glauber - Em lugar nenhum, por enquanto (risos). Eu preciso consertar a primeira e fazer a segunda.  São histórias que considero bacanas e que merecem conhecer o mundo.

 LDG - Você disse que gosta de falar de si mesmo utilizando suas obras como outros quadrinistas. Quais são seus quadrinistas favoritos e os que mais lhe influenciam?

 Glauber - O primeiro deles é Akira Toriyama que, sem sombra de dúvida, foi o meu grande mestre a distância e que me treinava sem saber. Takehiko Inoue e a sua incrível maneira de contar histórias que encantam, como Slam Dunk e Vagabond. A primeira, um tanto quanto adolescente mas que te prende fortemente. Fico pensando como uma pessoa conseguiu transformar uma história de basquete em momentos tão fodas. E Vagabond que é super visual...um mangá "quieto", por que muito do que se passa lá te faz querer ficar parado em um quadrinho por minutos...você quer ler a imagem. E na verdade, você precisa, se não, não vai entender a história. E pra terminar os artistas que me influenciam visualmente, tem o Hiroaki Samura, com a maneira espetacular de contar uma história de forma cinematográfica.
Ilustra de Florent Sacré, um dos ícones do Glauber.
Agora os que me influenciam na parte de roteiro, fotografia e outras coisas, tem o Miyazaki do Studio Ghibli, o Naoki Urasawa que conta uma história como ninguém. Tem o Nicholas de Créci, Bastien Vivés, Cyril Pedrosa,Moebius...
Todos eles me influenciaram de forma visual e de como contar uma história. Também não posso esquecer de Florent Sacré (com quem já tive a honra de conversar) Kim Jung Gi e Craig Thompson. Acho que é isso (risos).

 LDG - E entre as webcomics brasileiras? Se já chegou a se render a elas, quais são as que acompanha ou as que mais gosta?

Glauber - Não tenho muito costume de ler webcomics...não me recordo de nenhuma agora que eu realmente leia e acompanhe. Lembro de um tempo que parei pra ler o Ledd, e tava me interessando pra saber onde ia dar a história. Mas eu acho que ele parou de desenhar...não sei o que houve.

Ledd, de J.M. Trevisan e Lobo Borges

 LDG - Nem mesmo essas tirinhas sem continuidade que tanto habitam a internet brasileira, como Dr Pepper ou Um Sábado Qualquer?

 Glauber – Leio de vez em nunca. Não tenho muito costume, leio mais as que aparecem na minha timeline, no Facebook.


LDG – Compreendo. E influência de outras mídias? Cinema, TV e música? Acha que tudo isso que consome influencia no seu trabalho? Quais obras, em específico?

Snarky Puppy, banda que o Glauber curte.
Glauber - Sim, eu adoro cinema, fotografia e música. Acho que isso tudo tem a ver com quadrinhos. De filmes...bom, difícil pontuar aqui. Vou tentar falar de alguns que lembro agora: Birdman, A Teoria De Tudo, A Árvore da Vida, etc. Fotografia não sei te dizer um artista em específico. Eu vejo muita coisa linda na internet e não pego o nome do cara. As bandas que estou escutando agora são Snarky Puppy, Jason Mraz, Juanes, KT Tunstall, Djavan, Ivan Lins, Laura Pausini, Testament, NickelBack, The Knack, The Pillows, etc. Eu sempre tô escutando muita música e vendo muitos filmes.

LDG - Posso ver que os quadrinhos que lê são bem diferentes entre si assim como as bandas que escuta também não possuem um gênero ou estilo padrão. Na sua opinião, esse ecleticismo e variedade prejudica ou ajuda nos seus trabalhos?

Glauber - Pra mim ajuda, por que eu não gosto de mesmice. Acho que te limita criativamente e te faz sentir coisas repetitivas. A gente não consegue ser igual todo dia, mesmo que queira. Tem dias que você tá mais animado, tem dia que você tá mais irritado...e tem dia que você tá animado e feliz e no outro tá aborrecido e triste, entende? São uma série de sensações por dia. O que eu vejo, escuto e sinto precisa ser assim também. Tem que haver um movimento, dentro e fora.

LDG - Acha que conseguiria, por exemplo, escrever uma história sobre tristeza e, logo após que a terminasse, escrever uma sobre amores correspondidos sem que o contexto de uma influenciasse na outra?

Glauber - Acho que sim. Mesmo porque eu sei me desapegar das sensações que sentimos quando criamos. O único problema de escrever uma coisa em seguida da outra é que a sua cabeça tá cansada, e ainda apegado com a outra história. O que eu sempre faço é dar um tempo até que esteja totalmente desapegado. O que eu quis dizer é que eu consigo fazer com que essas duas histórias te passem sensações distintas. Cada qual cumprir com a sua função. E não fazer com que ,de alguma forma, uma esteja apegada a outra. Não sei se ficou claro.

LDG – Ficou sim, ficou sim. Para dar início a um novo "debate" - Uma das formas de ter certeza de que sua história vai tomar o rumo que você deseja é deixando-a sempre em suas mãos. Você, então, terceirizaria uma "história" sua ou algum personagem, como fazem os criadores de super-heróis e como fez Mauricio de Sousa com a Turma da Mônica? Tipo, deixaria que outras pessoas criassem histórias para eles mesmo que corresse o risco dos personagens sofrerem alterações indesejadas por você?

A admirada turminha da Mônica, de Maurício de Sousa.
Glauber -  Não. Eu sou muito excêntrico nesse ponto e faria mais ou menos como Miyazaki: teria um estúdio pra apenas produzir o que eu criasse. O roteiro ,então, sempre ficaria nas minhas mãos, assim como o ângulo de câmera, as falas e tudo o mais. E a arte finalização deixar na mão dos ilustradores.  Uma coisa que eu to fazendo com um amigo é uma parceria, onde eu escrevi a história e ele desenha.  Mas o roteiro, sofreu pouca influencia dele, assim como os desenhos sofrem pouca influencia minha.  Acho que assim as coisas andam melhor, por que tem a mesma personalidade do começo ao fim. O jeito que a Marvel faz pode-se notar que os personagens tem várias facetas, e isso eu não gosto. É interessante que um trabalho em quadrinhos tenha uma franquia de produtos, mas deve-se levar em conta a integridade e autenticidade da obra.
 Mauricio de Souza sabe controlar isso melhor, por que as historias da Mônica seguem o mesmo padrão desde sempre. Não ocorreu o mesmo com a Marvel. Certamente, o Mauricio analisa tudo com muito cuidado.

 LDG - Sim, como ele mesmo diz, nada é publicado sem que ele ou sua filha Marina, filha com maior participação nos estúdios, leia antes.

Glauber - Pois é! Existe uma preocupação maior do que mercadologia e eficiência nas vendas
Hoje em dia eu não leio comics e esse é um dos motivos. Já tem muita coisa feita que não tem o menor sentido nas séries. Homem Aranha, por exemplo, era o que eu mais gostava e eles destruíram o personagem com histórias nada a ver,vilões piores ainda. Por isso que hoje as histórias não tem a mesma força e, nos filmes, ficam focando só no começo da série. Na minha opinião, esse personagem tá quase morto!

Homem-Aranha, que Glauber diz estar quase morto. 

LDG - Mas não acha que se fosse o Stan Lee que escrevesse SEMPRE, como era no começo, o personagem hoje em dia  não seria o ícone que é?

Glauber - Se fosse ele sempre, seria totalmente diferente o rumo do personagem. Porque quer queira quer não, quando a gente cria algo, é parte da gente. E só o criador sabe o que ele quer com a cria e que rumo ela deve tomar.
Hoje os filmes da Marvel tem um padrão de qualidade porque ele tá envolvido...tenho certeza disso.

LDG - E nesse tempo em que inúmeros quadrinhos são adaptados pra séries de tv ou filmes, você já imaginou alguma obra sua sendo adaptada pra outra mídia? Ou gosta de imaginar um quadrinho apenas como quadrinho para que a pressa do seu pensamento não prejudique a obra?

"Mãe" que Glauber desenhou imaginando que poderia virar filme!
Glauber - Eu fico imaginando sim! Adoraria ver a história "Mãe" no cinema. Aliás, quando a escrevi, eu fiquei pensando e adaptando ela pro formato cinematográfico. Tanto que a dividi em 4 episódios mesmo sendo uma história fechada. A única ressalva que faria seria participar da produção animada (ou filmada) para que assim nada se perdesse e o diretor não viajasse muito com adaptações. Mais ou menos como o Lourenço Mutarelli (Corpo Estranho, O Cheiro do Ralo) faz. Aliás, eu admiro esse cara demais. Não entendi a parte de "pressa do pensamento"

 LDG - Por exemplo, se você não acha que pensar na HQ como um filme pode atrapalhar que você continue a encarando como uma HQ e acabe prejudicando a mesma por causa disso.

Glauber - Bom, eu pelo menos quando faço HQ, procuro sempre utilizar da linguagem de HQ adicionado a linguagem do cinema. Isso em tudo que eu faço então não encontro esse problema de adaptação. Também sei que certas situações da HQ, se adaptada ao cinema, elas precisam de nova roupagem. Porque é utilizado o movimento e o som.

LDG – Então pra você funciona?

Glauber – Funciona!

LDG - Com esse seu pensamento de que a "terceirização de personagens" ´pode prejudicar uma história...você toparia se fosse chamado pra escrever uma história pra algum personagem já existente?

Glauber - Se eu gostasse do personagem, sim. Mas você pode ter certeza que eu morreria de medo de descaracterizar ele. Por isso eu tenho essa preocupação com os meus personagens. Se uma pessoa quiser "terceirizar"o personagem dele(a), por mim tá ok.

LDG - Compreendido. Outro conceito - Você ilustra a história roteirizada por outras pessoas, mas roteirizaria algo por encomenda (quase como uma história feita como freelance) ?

Glauber - Claro que sim! Seria muito divertido! Eu não tenho restrição pra temas...quer dizer, terror eu não gosto. Então, tudo, menos terror, eu faria com gosto. A minha preocupação estaria mesmo com o prazo que me dessem. Porque eu gosto de estudar bem o que eu faço, odeio coisa mal fundamentada.

LDG - Mas não tem medo da pessoa ou instituição que tivesse incomodado ficar botando dedo no roteiro e acabar tirando a sua identidade da HQ?

Freelance que Glauber fez pra um casal. Fofo, não?
Glauber – Tenho (risos). Mas eu tenho a consciência de que desde o inicio, o projeto não é meu. Então fico mais tranquilo com isso. O que eu faço é ouvir o cliente, e saber se o que ele quer dá certo ou se fica bonito. Se não ficar, eu faço adaptações e explico os porquês.

LDG - Mas, por exemplo, deixaria ser publicado algum trabalho seu que você considerasse ruim mas que o cliente (que encomendou o trabalho) tivesse gostado?

Glauber - Sim, eu deixaria...se o cliente fizer muita questão ok. Mas eu não divulgaria (risos).

LDG - Pra você divulgar um trabalho seu, quais são as características que ele PRECISA ter? Cite três.

Glauber - Pra que eu divulgue um trabalho eu acho que ,essencialmente, PRECISA estar bonito. Então uma boa composição, boa escolha das cores e um bom contraste.

LDG - E o roteiro? Como o elabora a partir do momento em que a ideia surge na sua cabeça?

Glauber - Começo pelo ponto chave do roteiro que seria: o motivo dele existir. Tem gente que escreve focando no personagem principal e pra mim isso atrapalha. A história não tem motivo pra existir, e o personagem não adquire um propósito dentro da trama. Depois, eu escrevo o final. Eu preciso saber como ela vai acabar pra poder escrever o começo e depois o meio. Dessa forma, a história tem muito mais fundamento.

LDG - E quando se adapta histórias reais, como faz no seu projeto Love Files ?

Glauber - Aí fica mais fácil porque eu já tenho tudo: sei como tudo começou e como acaba. A minha unica missão é adaptar aquilo pra mídia em questão.

LDG - Como é esse projeto?

Glauber – Love Files eu comecei a produzir porque estava pensando em meios de ganhar dinheiro e ao mesmo tempo fazer o que mais amo, que são os quadrinhos. Já tinha dado um presente assim pra uma ex-namorada, e achei que poderia fazer isso para os outros. Porque não deixa de ser um presente bacana. Acabei encontrando o primeiro e segundo cliente, que pediram as histórias por encomenda. Aí é como contei: o cliente me manda a história meio que dissertando, e eu adapto pra quadrinhos. Depois o cliente avalia e eu finalizo. Pra fazer a versão impressa, eu peço permissão do cliente. Porque é a vida dele, tem total direito. Aí depende do tamanho da história (oito, doze, dezesseis, dezoito, vinte, vinte e quatro ou trinta e duas páginas), cada uma tem um preço.

Capa de Lifting Spirits, que você pode ler completa aqui!

LDG - E essas que foram produzidas, seriam histórias que você leria e recomendaria se não fossem suas ou as vê mais como um trabalho rentável mesmo?

Glauber - Nãoooo, foram histórias muito bonitas! Não sei se você leu, mas eu gostei muito do que descobrir. A primeira se chama Lifting Spirits e o que eu mais gosto de saber é que hoje eles são casados. Então isso me deixa muito satisfeito. Histórias com finais felizes. Aliás, eu sugiro dar uma lida. Vai ver como são histórias de romance bem bacanas. Se tiver difícil de ler os balões, pode fazer download das páginas.

Página de Lifting Spirits.
LDG – Mas enfim, para que a entrevista não fique quilométrica...seu projeto mais comentado atualmente é o Registros. Fale um pouco sobre ele.

Glauber – Sim. Bom, eu falo meio que a mesma coisa por aí (risos). Não tem muitas coisas diferentes também pra se falar (risos). Se trata de uma HQ que retrata minhas aventuras como mochileiro pela Argentina e pela Colômbia. Nessas histórias, coloquei um toque de poesia, de literatura, de drama, filosofia e aventura. Foi a maneira que encontrei pra traduzir tudo que vivi. Porque na real, é um pouco impossível de querer traduzir todas as maravilhas que é fazer uma viagem como  mochileiro. Mas as principais coisas tão lá. São 48 páginas de conteúdo bem bacana, que não se vê muito por aí. Todas são coloridas, tem uma sessão de dicas pra quem quiser se tornar mochileiro também. 

LDG - E como surgiu a ideia? Veio depois da viagem finalizada ou enquanto você viajava já estava pensando "Putz, isso aqui dá uma HQ, hein?" ?

Glauber - Não, não. Como disse lá no começo, eu precisava escrever uma HQ que fosse mais rápido de fazer, que coubesse dentro do meu tempo. A ideia veio uns vinte dias depois de eu voltar pro Brasil. Pensei comigo que seria uma boa contar, já que foram acontecimentos tão diferentes e bem longe do comum.



LDG - Sempre que termino de escrever qualquer coisa,a  primeira pergunta que me faço é - Por que os outros leriam isso? Então...por que acha que as pessoas leriam Registro? E você a leria, pra início de conversa?

Glauber - Acho que Registros vale a pena ser lido por pessoas que sejam curiosas pela vida e que gostam de desafios. Foi isso que me motivou a viajar. E durante a viagem, passei por transformações muito grandes. Acho que todo ser curioso, busca por essa evolução pessoal e Registros tem essa capacidade de conectar o leitor, desde a dúvida, o caminho do esclarecimento e a resposta. No final, se tem uma realização. Hoje me sinto muito mais realizado e através da história, conto como isso aconteceu. É praticamente um convite do tipo "ei, leia essa história aqui. Ce vai ficar louco querendo viajar também e descobrir coisas do mundo e de si mesmo que jamais poderia imaginar!"

Preview de Registros.

LDG - E por que resolveu ilustrar com este traço mais amigável ao invés do traço mangá que você tanto prefere?

Glauber - Porque eu acho que não caberia o estilo mangá. O assunto em si foge da narrativa do mangá, então era importante criar um traço. Quem me conhece sabe que minhas raízes são o mangá. E eu não consigo fugir muito...se você reparar, ainda tem muita coisa que lembra.

LDG - Consegue enxergar Registros crescendo e ganhando "sequências", mesmo que não sejam adaptadas de viagens reais?

Glauber - Eu prefiro focar em viagens reais...mas nunca se sabe, né?

LDG - E o medo de rolar aquela pressão? De toda viagem que for fazer acabar tendo, consigo mesmo, a obrigação de registrar em HQ?

Glauber - Na verdade não. Eu já tive uma conversa séria comigo mesmo pra que essa paranoia não ocorra. E decidi que somente as histórias que mudarem a minha vida de alguma forma merecem um registro.

LDG - Além, então, de persistência e teimosia...faz parte do seu lema o tal do auto-controle, né?

Glauber - Eu não diria que é um lema, mas é algo que procuro ter sempre dentro dos meus hábitos. Acho importante a gente estar se policiando, até pra não falar bobagem, ou se irritar demais...ou qualquer comportamento que cause desarmonia á toa.

LDG - Tudo isso pensando no bem estar da sua obra...e do seu mesmo, né?

Glauber – Exatamente. A viagem me ensinou que somos capazes de ter controle total sobre nossas vidas, mas não pela vida. Não podemos controlar nada, apenas participar.

LDG – Algo parecido com destino?

Glauber - O destino é entendido como algo pre destinado. E eu não sei se tudo é pré destinado...ou parte. Não sei mesmo. O que eu sinto é que a vida nos trás coisas pro nosso crescimento. Mas se aquilo já estava escrito pra você, eu não sei.


LDG - Entendo. Bem, Glauber, a entrevista já está chegando ao fim...então, gostaria de lhe perguntar mais duas coisas: Primeiro, para os leitores que estão pensando em começar a ler quadrinhos agora, o que você sugere como um bom HQ de início?

Glauber - Acho que se for uma criança, começa com Turma da Mônica que é legal. Se for adolescente, pode ler mangá ou comics...então eu sugiro Dragon Ball e X-Men. São clássicos que mostram os padrões de cada estilo e vai situar bem a pessoa.  se for adulto, que ele ou ela leia graphic novels, seja MSP ou títulos europeus e americanos. Ah!! Que leia também os mangás, seinen como Monster, de Naoki Urasawa.

LDG - E as dicas para quem está pensando em começar a trabalhar com quadrinhos?

Glauber - Pra trabalhar com quadrinhos, antes de tudo tem que aprender a desenhar fazendo cursos de desenho. Assim que a pessoa se sentir bem desenhando, que tudo estiver meio que dominado, aí fazer um curso de roteiro (que a maioria não faz). Quando for começar a praticar, fazer histórias curtas de duas páginas com começo, meio e fim. Além de fazer tiras. Começando a se sentir confortável, aumenta o número de páginas. Fazer vários temas pra ir se acostumando com os tempos que cada tipo de quadrinho dispõe. Tenho certeza que, começando assim, essa pessoa vai se tornar um grande profissional!


LDG - Muito obrigado, Glauber. Valeu mesmo por ter topado participar da entrevista o/ !


Não deixem de acompanhar o Glauber no Face e na página de Registros 

terça-feira, 21 de abril de 2015

Velozes e Furiosos 7 - Prós e contras.


 Acabou de ser lançado o tão comentado Velozes e Furiosos 7!
 Mesmo estando em primeiro lugar nas bilheterias brasileiras (e faturando MUITO no resto do mundo), ainda há os terríveis cinéfilos que se recusam a assistir ou gostar dos filmes da franquia. Claro que ninguém é obrigado a gostar, afinal não é o melhor filme do mundo nem no quesito de ação e nem no quesito corrida (e em quesito nenhum), mas não se pode negar que há vários fatores a serem comentados sobre a franquia.
 Então o que se resta é comentar o que é ruim no filme, o que faz chorar, o que é engraçado e o que é que vai ser lembrado daqui a trinta anos. Tudo isso analisando os prós e contras do longa, tanto em individual quanto fazendo parte de uma franquia.


sábado, 4 de abril de 2015

Pré-julgamento de Trocando os Pés


 Uma das coisas mais erradas de se fazer no ato de julgar um filme é, com certeza, não tê-lo assistido antes de criticar. Mas só por ser errado não significa que as pessoas não façam.
 Todos sabem que você fica enojado de tanta melação ao ver o trailer de Cidades de Papel, assim como já até deu nota no IMDB pro Mad Max: Estrada da Fúria.
 Uma das coisas que mais ajuda no pré-julgamento de um filme (o famoso pré-conceito) é, claro, o ator principal. E todos sabemos a má fama que Adam Sandler tem entre os cinéfilos.
 Trocando os Pés, novo filme estrelado pelo ator, estreia dia 09 de abril de 2015 e seu elenco, produção, roteiro e trailer é o que nos ajuda a ter uma noção do que é que ele vai ser...


sábado, 28 de março de 2015

THC




 Puxei beck, puxei beck, puxei beck
 Puxei!
 Puxei beck, puxei beck,puxei beck
 Puxei!

 É só um som aleatório, não vem com interrogatório
 Peguei dinheiro do Monopoly e queimei
 Minha viagem é de graça, conseguida lá na praça
 Legal pros meus parças mas não pra sua lei.

 Eu vou pra cadeia por me sentir feliz
 mas na tristeza da minha mãe ninguém pensa, né? Me diz.
 Me dá prazer e é natural, cresce no mato igual cacau
 mas chocolate não é ilegal.

 É considerado loucura
 meus olhos vermelhos, meu cheiro nos dedos e a minha tontura.
 Eu quero entender qual é o problema
 se todas as preocupações eu peguei rapidão e enrolei na seda. (2x)

 Eu sei que é crime, por favor não atire
 Pois bala de polícia ,além de doer, corta a brisa.
 Escute o que eu te falo, meu caro gambé
 Morre mais gente por álcool, dinheiro e mulher (mulher).

 Se fosse pelo mundo eu seria assassino,
 mas tal fuga embeleza a vida e me deixa bonzinho.
 O ódio sempre passa com a ajuda do verde
 que traz com força o sono, a fome e a sede.

  É considerado loucura
 meus olhos vermelhos, meu cheiro nos dedos e a minha tontura.
 Eu quero entender qual é o problema
 se todas as preocupações eu peguei rapidão e enrolei na seda. (2x)

 Se fossem pedras eu acordaria em frias vielas e fendas
 Mas já que são ervas, viajo pras belas capelas de Valfenda.
 Você com a paz em carência, veste uma venda e corre pra igreja.
 E eu com a flor da ciência só gasto minha renda com abstinência.

  É considerado loucura
 meus olhos vermelhos, meu cheiro nos dedos e a minha tontura.
 Eu quero entender qual é o problema
 se todas as preocupações eu peguei rapidão e enrolei na seda. (2x)

sábado, 21 de março de 2015

Que Vença o Melhor - Bob Esponja - O Filme VS Bob Esponja: Um Herói Fora D'Água


 Quando uma série animada ganha notoriedade e auto-confiança o suficiente para ser transformada em longa-metragem, muito está em jogo. Os fãs de cinema precisam ser agradados, os fãs do próprio desenho animado precisam ser agradados, Crianças devem gostar. Adultos devem gostar. O filme deve faturar o suficiente para cobrir os gastos de produção (afinal, animações são bem caras). E, como o mundo do entretenimento agora funciona assim, deve ter potencial para gerar sequências.
 Se foi assim com tantos filmes animados, não seria diferente com Bob Esponja.
 A série da Nickelodeon tão aclamada, apesar de boba e com um tipo de comédia infantilóide disfarçada de infanto-juvenil, conquista fãs por todo o mundo e está em TODA prateleira de lojas de brinquedos, farmácias e roupas com estampas.
 Em 2004, o primeiro longa da série, Bob Esponja  - O Filme, saiu nos cinemas e, agora em 2015, o segundo filme foi lançado com o título de Bob Esponja: Um Herói Fora D'Água.
 A questão é a seguinte: Com dois filmes baseados no mesmo desenho animado, como concluir qual dos dois é melhor? Debaixo de cinco quesitos, poderemos chegar a uma resposta.


sábado, 14 de março de 2015

Por Trás da Letra de A Sua Assinatura (Matanza)


 Depois de sete álbuns (sendo um ao vivo, um de covers de Johnny Cash e outros cinco autorais), o Matanza, depois de três anos sem nenhum lançamento, resolveu dar as caras.
 Em abril, será lançado o disco novo da banda intitulado de Pior Cenário Possível..
 E foi no dia 9 de Março de 2015 que a primeira música do disco foi revelada. "A Sua Assinatura" possui uma letra curta porém difícil de se decorar pela velocidade agradável em que Jimmy London profere os versos bem ritmados porém muito chiques em sua vulgaridade (a peculiaridade das letras do Matanza, em sua maioria compostas por Donida, é sempre falar de bebedeira e vagabundagem com termos cultos e palavras garbosas).
 Já o instrumental resgata um medo que surgiu nos álbuns "A Arte do Insulto" e "Odiosa Natureza Humana" e que pensávamos ter sido aniquilado em Thunder Dope - O medo do Matanza ter se esquecido de que seu grande diferencial é a pegada country e quase cômica de seus riffs e partir direto pro lado hardcore da coisa. O medo é que esses cariocas tenham se cansado de cantar countrycore sobre bebedeira e vida de bar para cantar apenas uma espécie de hardcore sobre um sujeito raivoso, anti-social e porradeiro.
 Mas, como mencionado antes, Thunder Dope já resgatou nossa esperança com as excelentes faixas Devil Horse (que, como disse o crítico Thiago Cardim, possui guitarras que imitam banjos) e My Old Friend Liver. E também devemos lembrar que essa levada country também aparece nos álbuns anteriores, como em "Sabendo que Posso Morrer".
 A esperança se mantém erguida de que o Matanza não irá nos decepcionar, como nunca decepcionou, e o que se tem a fazer é gritar, balançar os cabelos e ouvir repetidamente A Sua Assinatura, sem esquecer de prestar atenção em sua letra, digamos que, curiosa.

domingo, 8 de março de 2015

Vinte e um.

Este é blog é na maior parte do tempo dedicado a textos escritos por mim - Raphael Guimarães. Mas quase nunca abrimos espaço para que outros autores tenham oportunidade de publicar textos seus, mesmo que prefiram manter sua identidade preservada.
 A crônica abaixo foi escrita pelo autor J.R., e tem como título "Vinte e um"!



sábado, 28 de fevereiro de 2015

Resumão do Oscar 2015.


 Pois é, já faz quase uma semana que rolou a cerimônia do Oscar 2015 e todo mundo já sabe os ganhadores em todas as categorias de cor e salteado. Mas todos sabemos que o mais legal não é a premiação em si, mas a cerimônia. Dessa vez, tivemos o Barney Neil Patrick Harris na apresentação de uma festa não tão divertida quanto a do ano passado mas que nos arranca diversos sorrisos.
  Acompanhe agora, mesmo que com um pouco de atraso, um resumo básico de CADA segundo do Oscar.
 E se tiver faltando algo que, por favor, reclamem nos comentários. Quero, tanto quanto vocês, saber de tudo que rolou na festa mais esperado do ano...todo ano!!


quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

O Lamentável Destino de Júpiter


 Desde o final dos anos 90 que os irmãos Wachowski tentam emplacar sucesso e fazer nome como grandes diretores. Mas não dá. Simplesmente não dá.
 Eles conseguiram, em Matrix, usar todo o talento que tinham disponível. Claro, isso foi bom porque nos presenteou com um dos melhores filmes de ficção científica de todos os tempos. Mas também foi péssimo, pois nos obrigou a assistir mais vários filmes péssimos dos mesmos diretores, que só lembramos o nome porque é um nome bonito e porque...um deles trocou de sexo nesse meio-tempo.
 As sequências de Matrix, A Viagem, Speed Racer...nada que veio deles agradou. Cada um de seus serviços apenas tem a utilidade de mostrar o quanto Matrix foi um golpe de sorte.
 Então, pra essa lista, acaba de entrar o mais novo filme dos irmãos - O Destino de Júpiter, aventura de fantasia e sci-fi extremamente cafona e mal feita.
 Afinal, todo ano precisa de um filme que logo no começo mostra ser uma enorme besteira cômica.


sábado, 14 de fevereiro de 2015

Eu Também.



  Um homem caminhava de volta para casa. Sentia-se muito mal.
 Tinha uma das piores vidas da qual já ouvira falar. Sem emprego nenhum, sem um tostão no bolso. Vontade de mudar? Imensa. Incentivos? Zero. Jamais procurava emprego e se, por ventura, encontrasse algum, uma desculpa surgia. Ás vezes inventava uma doença que o impossibilitasse de trabalhar. "Pouco dinheiro", dizia ele. Precisava de mais.
 E pra quê precisava de mais? Preso nas suas veias dos braços uma grande seringa preenchida por substâncias caras. Caras e ilegais. Ilegais e fatais. Justificava bastante a rejeição de empregos. Mas não só isso.
 Seus olhos vermelhos faziam-lhe lacrimejar a todo o tempo. Um cigarro comprido ocupava-lhe os lábios e tirava-lhe o fôlego. Quando abria a boca e soprava a fumaça fétida para o alto um hálito enojante de álcool a acompanhava.
 Continuava andando. Cambaleava vez ou outra com os sentidos entorpecidos das drogas que não lhe davam mais prazer, só lhe davam tontura e lhe traziam á mente tudo que havia de ruim. Não lembrava nem quem era, apenas do que não era - Bom.
 Dois passos á mais. Se sente tonto. Escorrega nos próprios sapatos e cai ao chão. Usa as mãos pra que o rosto não atinja o duro concreto da rua. Se levanta...a mão sangra. O sangue escorre pelo dedo anelar direito. Observa a mão.
 - Eu me odeio. - Resmunga o homem. A mão, a não ser pelo sangue que tanto teimava em escorrer mesmo que fosse chupado e cuspido de volta ao chão em que havia caído, era totalmente limpa. Quando tocava a própria palma sentia uma pele macia, fofa e lisa. Olhou para o dedo novamente e notou que era o dedo anelar. Riu baixinho ao pensar que aquele era um dedo praticamente inútil...jamais colocaria uma aliança ali. Adoraria, mas a mente racional e inteligente que pensava ter sabia que isto não aconteceria.
 - Eu me odeio. - Voltou a resmungar. Chupou e cuspiu novamente uma quantidade considerável de sangue do dedo quando finalmente voltou a andar com atenção pela rua e notou, á sua frente, um casal caminhando de mãos dadas.
 Eles estavam há alguns passos á frente do homem. Andavam despreocupados enquanto conversavam. Envoltos por risos alegres e que, vez ou outra, eram interrompidos por selinhos.


 O homem estava tão perto do casal que podia ouvir parte de sua conversa. Foi quando ouviu a garota dizer de forma espontânea:
 - Eu te amo.
 A resposta de seu namorado não tardou:
 - Eu também.
"Eu também"? Que tipo de resposta é essa? A garota havia acabado de declarar seu amor ao namorado e o rapaz apenas concordou como resposta? Esta era uma das coisas que o homem, que "sem querer" ouviu o diálogo do casal, não conseguia entender. Ela lhe oferece amor, e ele retribui com egoísmo? Com a falta de expressão que não demonstra nenhuma reciprocidade? Simplesmente não entendia.
 Sentiu até dó pela garota. Mas sentiu, com uma intensidade maior, inveja do rapaz. Como pôde ter conseguido uma namorada dando aquele tipo de resposta? Ainda mais uma namorada linda como aquela.
 A garota, mesmo observada de costas, era admiravelmente bonita. Seus cabelos loiros, lisos e compridos balançavam com o vento a cada passo dado pelas longas e grossas pernas da bela garota.
 Gostaria de ter alguém.
 Seu celular começou a tocar. Enfiou a mão no bolso e em um instante já examinava a tela do telefone anunciando a ligação que estava sendo recebida de um número desconhecido. Antes de atender, reparou no dedo anelar. O sangue já não mais escorria.
Atendeu. Uma voz desconhecida lhe perguntou o nome e ele respondeu. Era uma oferta de emprego.
 - Temos uma entrevista pra você. No setor de expedição da nossa empresa. O salário inicial é razoável, mas as oportunidades de crescimento são enormes.
 - Sabe me dizer qual seria o trabalho a ser desenvolvido?
 - Há grandes oportunidades de crescimento dentro da nossa empresa, mas de início ajudaria em serviços como carregamento de caixas....
 - Perdão, não vai dar. - Resolveu interromper. Pôs a mão livre nas costas e se lembrou da dor que sempre encontrava como desculpa. - Eu tenho problemas de coluna e...
 Sua visão lhe interrompeu. Novamente, quase que contra a sua vontade, seus olhos captaram a imagem do casal que caminhava á sua frente. Focou no rapaz. Além de ser alto, andava com passos lentos e retos. Não conseguia de maneira nenhuma imaginar um homem como aquele tropeçando, de tão alinhados e precisos que eram seus passos. E, apesar da volumosa blusa de frio que estava usando, era possível perceber que o rapaz estava andando com a coluna ereta, valorizando seus ombros largos e olhando direitamente para a frente. Volta e meia, a garota soltava uma risada gostosa e confortável de ser ouvida e caía com a cabeça apoiada nos fortes ombros do rapaz. Então, lembrou-se de que estava ao telefone, arrumou sua própria postura e, em segundos, já estava andando com a coluna 'endireitada" como o rapaz á sua frente. Continuou falando. - Eu aceito. Pode contar comigo nesta entrevista.


 Continuaram conversando. Acertaram horário, local e até a vestimenta. Pronto. Estava agendada a entrevista em que, descobriria mais tarde, passaria facilmente. Ao apertar o botão do celular para encerrar a chamada nem notara que seu telefone não era mais simples e antigo como há minutos atrás, como agora era um bem mais moderno, fino e com dispositivo touch screen. Guardou o aparelho no bolso da calça, que já não era mais apertado, rasgado e sujo. Suas roupas, em segundos, se tornaram bonitas, limpas e novas. Isso sem contar seu bolso esquerdo, visivelmente cheio por uma carteira gorda que há poucos segundos atrás possuía apenas dois ou três cartões de pizzarias e números de prostitutas e fornecedores de suas drogas.
 As mudanças foram instantâneas. Instantâneas e imperceptíveis. Seu dedo não mais sangrava.
 O casal á sua frente então o surpreendeu com um ato simples.Diminuíram os passos até que pararam, se aproximaram, deram um beijo rápido porém...fofo? Por que pensara naquilo? Eles apenas tocaram os lábios por menos de um segundo, como poderia achar aquilo fofo?
 O casal voltou cada um á suas posições naturais e voltaram a caminhar. Ainda indignado consigo mesmo, o homem ouviu a mulher comentar algo sobre o 'selinho'. Sobre ser bom. Sobre ser realmente muito bom.
 Sem notar o quanto estava obcecado pelo casal, o homem notou cada movimento brusco ou leve no corpo do rapaz. Enquanto segurava a mão da namorada com o braço esquerdo, o direito se esticou e pegou no bolso um chiclete. Atirou-o a boca. Observando-os pelas costas, notou levíssimos deslocamentos no maxilar do garoto á sua frente e percebeu que o mesmo estava mascando o tal chiclete.
 Riu. Ao abrir a boca com cuidado para que seu cigarro não caísse, a fumaça do mesmo veio até sejs irritados e vermelhos olhos. Lacrimejaram. Seu nariz também se irritou e escorreu. Não era apenas cheiro de fumaça. Era podre. Um odor totalmente desagradável, semelhante a carvão ou um monte de papel queimado.
 Apostava que o hálito do rapaz á frente era agradável. Talvez até com aroma do chiclete que mastigava.


 Os olhos lacrimejaram mais e sua visão ficou, por um instante, deturpada e embaçada como se estivesse vendo tudo através de um óculos cheio de arranhões em suas lentes. Fechou os olhos para que tal sensação passasse e perdeu o equilíbrio. Cambaleou novamente e quase que reencontra o chão mas mantém a postura reta e consegue se equilibrar firmando os pés com força no chão, levantando um pouco de poeira e propagando um som leve como o bater da porta de um carro.
 Ao entreabrir os olhos para se estabilizar, notou que o casal havia olhado para trás por causa do barulho. A garota tinha um rosto lindo, com olhos azuis e traços bem definidos. O rapaz tinha belos e escuros olhos castanhos, com o rosto limpo e um olhar centrado, ciente.
 Assim que se reergueu e se mostrou pronto para continuar a caminhar, o casal voltou a olhar para a frente e caminhando.
 Seus olhos eram vermelhos, o do rapaz castanhos. Seu olhar era sonso e perdido, o rapaz era sério e decidido. Seu hálito emanava uma vida regada a cigarros, bebidas e todo tipo de entorpecentes, o rapaz emanava o aroma de chiclete pela boca. Seus braços eram magros e com seringas espetadas nas veias, já os do rapaz eram fortes e sua mão segurava a mão da garota mais linda já vista por ambos os homens.
 Cuspiu o cigarro no chão. Arrancou as seringas dos braços e gemeu baixo pela dor repentina. Respirou fundo soprando seu hálito para baixo, cuspindo saliva enegrecida de cinzas. Esfregou o rosto com as mãos.
 Descobriu o rosto. Se analisou. Visão limpa. Tinha certeza de que o castanho de seus olhos agora era notável. Há anos não enxergava tão claramente. O mundo parecia até mais bonito, mais fácil...mais seu. Abriu a boca, surpreso. Seu hálito chegou até o próprio nariz mas não lhe fez lacrimejar dessa vez. O odor de ervas, cinzas e álcool agora fora substituído pelo aroma doce de tutti-frutti.
 Ao notar tais diferenças instantâneas no rosto, não tardou a apalpar os próprios braços. Não estavam musculosos como um marombado de academia, mas fortes e saudáveis como de alguém que se alimenta, trabalha e cuida de si mesmo. Não com força sobrenatural e muito menos heroica...porém sentia que poderia levantar o mundo nos braços. Seu olhar se estendeu por todo o próprio braço, seu antebraço...e finalmente as mãos. Notou o dedo anelar. Nele, agora estava uma bela aliança que não se lembrava de ter colocado.
 Como? Não colocara aquilo. Nunca. Afinal, era esse um dos grandes motivos de ter dito, há momentos atrás, que se odiava. Claro, isso e as drogas, o desemprego, a pobreza e toda a medíocre vida que leva...ou levava a momentos atrás. Como tudo mudara? Ou melhor, como poderia ter dito que se odiava?
 Olhou para o casal e viu que andava tão perto deles que poderia muito bem ser confundido com a sombra do rapaz. Notara até mesmo que ele e o tal "namorado" eram estranhamente parecidos.
 Fechou os olhos com força. Abriu-os.


  Mais ainda havia mudado.
  Não se encontrava mais perto do casal. Agora era parte dele. Com braços fortes, andar linear e ciente, olhos castanhos, hálito fresco e empregado. Andava de mãos dadas com a garota. O homem que há pouco seguia o casal com visão entorpecida e sentimentos abalados, agora segurava a mão de alguém tão bela a ponto de abalar sua visão e entorpecer seus sentimentos. Era, ele mesmo, o rapaz que tanto invejara.
 Olhou para trás. Caído no chão, bem perto dele e de sua namorada, um homem jazia morto. Vestia roupas sujas e rasgadas, possuía um cigarro caído perto da boca seguido por baba e pelas seringas que saltaram de seus braços, provavelmente, quando caíra. O rosto era semelhante ao que seu já fora. Olhos arregalados, sem vida e vermelhos como sangue. O dedo anelar da mão esquerda rasgado. Em carne viva.
 Podia ter sido seu fim. Aquele podia ter sido seu destino se não houvesse mudado. Adorava sua nova vida. Como pôde ter dito que se odiava?
 - Eu te amo. - Ouviu sua namorada dizer com a voz doce que chegou a seus ouvidos anunciando finalmente a paz e alegria de uma vida digna.
 Olhou novamente a si mesmo. Possuía dinheiro. Estava saudável. Apresentável. Dependente de si, ciente e vivendo como um ser humano deve viver. Sentia orgulho de si mesmo. Respirou fundo e sentiu seu pulmão limpo. Olhou para a namorada e a respondeu:
 - Eu também.

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Top V - Melhores Papeis de Roberto Gomez Bolaños

[ESSE TEXTO TINHA SIDO ESCRITO PARA SER PUBLICADO NO FINAL DE 2014, MAS DEU RUIM. PELO CONTEÚDO ATEMPORAL, JÁ QUE BOLAÑOS NÃO PRECISA DE MORTE PRA SER HOMENAGEADO, A PUBLICAÇÃO VEM AGORA.]

 Recentemente, a cultura popular perdeu um grande nome. O caríssimo Roberto Gomez Bolaños (famoso principalmente no Brasil por escrever e atuar nas séries Chaves e Chapolin Colorado) faleceu ao ter uma parada cardíaca dia 28 de Novembro de 2014, em Cancún, México.
 Sempre que há algum famoso vem á falecer, dois fenômenos ocorrem.
 O primeiro deles é a comoção. Fãs e admiradores de seu trabalho pelo mundo todo desabam em lágrimas. A maioria delas linda (como tantas artes de Chaves chegando ao Céu e encontrando Seu Madruga) e emocionante.
 Outro fenômeno é o menosprezo que tal artista sofre por parte de um público específico - Os trolls. Comentários sobre "só fez sucesso depois que morreu" ou "só fez um papel bom na vida toda" surgem adoidado.
 Para perturbar a memória de Bolaños, os comentários mais ofensivos possíveis foram "Só fez Chaves" e "Ator ruim que deu sorte fazendo Chaves".
 E pra provar que Bolaños foi muito mais do que apenas Chaves, uma pequena lista de papeis que o grande Shakespeare mexicano (por isso chamado de Chespirito) chegou a interpretar magistralmente, dentro ou fora das séries que os consagraram.


terça-feira, 6 de janeiro de 2015

O Guia Oficial de 2015 (segundo De Volta Para o Futuro)

 2014 foi ruim pra você? Não se desanime, ele não foi bom para muitas pessoas (independente do que elas dizem no Facebook).
 Mas 2015 acaba de chegar e só há um jeito de se dar bem nele (coisa que tu não fizeste ano passado) = Estando preparado pra ele. Como? Simples.
 Em 1985, Marty McFly voou (SIM, VOOU) para o futuro com seu amigo, o cientista Doc Emmet Brown e sua namorada  Jennifer e, ao chegar em 2015, observou uma porção de evoluções em sua cidade que com certeza se aplicam no mundo inteiro.
 Então, assim como o Capacitador de Fluxos é o que torna a Viagem no Tempo possível, as informações que McFly adquiriu em De Volta Para o Futuro II são o que tornam possíveis todas as dicas que você verá aqui...no Guia Oficial de 2015 (segundo De Volta Para o Futuro).
 Então aperte os cintos de sua máquina do tempo e prepare-se para descobrir como será seu ano...que com certeza te surpreenderá.